quinta-feira

A ÚLTIMA VEZ



Já aqui me referi ao caso que, comigo ocorreu, há uns bons anos atrás, envolvendo o meu saudoso Mini Moke.
Saltou-me a roda dianteira do lado esquerdo e o veículo ainda seguiu desgovernado durante uns segundos.
Tudo porque me tinha furtado uma das porcas que ligavam a jante ao eixo.
Felizmente, não se verificaram quaisquer danos: nem pessoais nem materiais.
Como disse, embora não houvesse culpa da minha parte, haveria sempre lugar ao pagamento de uma indemnização, por força da responsabilidade objectiva de quem é proprietário de um veículo automóvel. A companhia de seguros teria sempre de suportar esse tipo de despesas.


RODA

Ora um caso semelhante ocorreu aqui há uns tempos.
Um Volvo encontrava-se na oficina, a fim de ser efectuada a revisão.
O veículo foi entregue, após a mesma ser dada por terminada.
E, após o condutor ter percorrido poucos quilómetros, salta uma roda e o carro despista-se.
Neste caso, tinha havido culpa de alguém.
O mecânico tinha montado as rodas, colocou as porcas nas jantes. Mas, por esquecimento, não deu aquele aperto final com o compressor.
Evidentemente, em circulação, a roda foi oscilando até se libertar do eixo.
Também, felizmente, não houve danos.
Mas ali havia um culpado.
Já se calculava que o empregado não iria sair beneficiado por aquele grave esquecimento.
Verificava-se, aliás, uma circunstância. O carro era de um dos administradores do concessionário da marca.
De modo que o mecânico foi despedido, com justa causa.
O seu advogado pôs a empresa em tribunal. Reconheceu a falha do trabalhador, mas argumentou que se tratava de um episódio absolutamente ocasional, que não revelava uma inobservância constante dos seus deveres laborais.
A sentença não lhe foi favorável. O tribunal confirmou o despedimento e deu razão à entidade patronal.
Nesta matéria, o que está em causa, de um modo geral, é, efectivamente, uma permanente violação das obrigações do empregado.
Toda a gente tem os seus dias menos favoráveis, em que alguns erros poderão ser cometidos. Não se vai despedir uma pessoa só por cometer uma falta, que raramente ocorre. Mesmo que seja intencional, um desrespeito dos deveres, que surja numa ocasião, não pode servir para dispensar logo o trabalhador.
Esta é, portanto, a norma genérica. Só há justa causa de despedimento quando o trabalhador constantemente deixa de cumprir as suas obrigações.
No entanto, há excepções.
Se o erro for grave, ainda que apenas ocorra uma vez, quebra-se totalmente a confiança no trabalhador. Há motivo para despedimento, com justa causa.
Não importa se a falta foi cometida propositadamente ou por lapso. A mera ausência de cuidado é suficiente para que a entidade patronal invoque a justa causa.
Foi o que sucedeu neste caso, das rodas que ficaram desapertadas.


MAQUINISTA

Também, numa ocasião, um jovem maquinista de comboios foi despedido, sem que ele tivesse propriamente feito algo de errado intencionalmente.
Mas a verdade é que adormeceu, enquanto se encontrava na sua cabine, com a máquina em circulação, atrelando carruagens de passageiros.
Ao chegar a uma estação, ele encontrava-se embrenhado no sono e não imobilizou a composição.
Os passageiros que estavam na plataforma tinham sido avisados da chegada do comboio e aproximaram-se da extremidade mais próxima da linha férrea. Num misto de espanto, de sarcasmo, de aborrecimento e até de algum sobressalto, viram-no passar à velocidade habitual com que circula entre estações.
No interior da composição, os utentes que pretendiam sair naquela paragem, começaram a aperceber-se de que apenas poderiam ver a estação em breves instantes, inviabilizando-se a sua descida conforme planeavam.
É claro. Foi a última vez que este maquinista comandou um comboio.